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O que o Congresso Nacional tem feito no combate à exploração sexual infantil no Brasil?

Na semana em que se comemora o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) manifestou preocupação com decisões judiciais brasileiras que “podem isentar de responsabilidade penal, em determinados casos, atos de violência sexual contra meninas e adolescentes”, visto que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) do Brasil emitiu quatro decisões que afetam os direitos de crianças e adolescentes com menos de 14 anos de idade.

O Brasil é historicamente considerado – até o momento – referência internacional na defesa e promoção dos direitos da infância e da adolescência. No entanto, apesar da consolidada base jurídica no tema, no que se refere à exploração sexual de crianças e adolescentes - uma das piores formas de trabalho infantil-, os dados recentes revelam um cenário alarmante: segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2024, houve um aumento de 24,1% nos casos de exploração sexual infantil no Brasil de 2022 para 2023, e o projeto MAPEAR registrou um aumento de 266,91% nos pontos vulneráveis à exploração sexual infantil entre os períodos de 2019/2020 e 2021/2022.

Nesse sentido, destaca-se o papel crucial do Congresso Nacional, responsável por legislar e fiscalizar, e que, conforme aponta o Relatório “Infância Segura”, ainda atua de forma muito reativa, sendo necessária uma atuação mais preventiva, centrada em políticas públicas estruturantes. No tema da exploração sexual infantil, recentemente foram aprovados pelo Congresso Nacional e sancionados pela Presidência da República três marcos normativos: a Lei nº 14.811/2024, que prevê a Política Nacional de Prevenção e Combate ao Abuso e Exploração Sexual da Criança e do Adolescente; a Lei nº 15.032/2024, que condiciona a transferência de recursos públicos para entidades desportivas ao compromisso de adoção de medidas para proteção de crianças e de adolescentes contra abuso e exploração sexual; e a Lei nº 15.073/2024, que prevê sanções aos prestadores de serviços turísticos que cometerem infrações associadas à facilitação do turismo sexual.

Além desses marcos legais, há outros Projetos de Lei que merecem destaque. Em relação ao enfrentamento da exploração sexual em grandes obras, no âmbito da Comissão Parlamentar de Inquérito ocorrida em 2014 para apurar denúncias divulgadas na imprensa sobre turismo e exploração sexual de crianças e adolescentes, foi proposto o PL 8042/2014, que estipula que as empresas executoras de grandes obras adotem plano de combate à essa violação. Mais recentemente, tramita o PL 2193/2024, que obriga os responsáveis por obras e serviços, com ou sem financiamento público, a prevenir, mitigar e remediar esta violação e que, diferentemente do PL anterior, avança em sua tramitação.

Por fim, requerem atenção os PLs relacionados à exploração sexual infantil em ambientes virtuais. De acordo com pesquisa realizada pela SaferNet, foram detectados 2,65 milhões de usuários em grupos e canais do Telegram contendo imagens de abuso e exploração sexual infantil durante o ano de 2024. Nesse âmbito, há um conjunto de Projetos de Lei - PL 1022/2019, PL 1591/2019 e PL 2184/2019 - que propõem alterar diferentes legislações referentes à comunicação e à internet para obrigar a veiculação de mensagens e campanhas educativas de combate à exploração sexual de crianças e adolescentes nos meios digitais. Outros, como os PLs 3287/2024 e 369/2025 enfatizam mecanismos de prevenção e proteção em ambientes virtuais, e estão com intensa movimentação em sua tramitação. Todas essas proposições legislativas merecem a atenção e a incidência da sociedade civil organizada e dos diferentes setores do Sistema de Garantia de Direitos a fim de que esses PLs contemplem a devida proteção de crianças e adolescentes nesses ambientes.

Ao mesmo tempo em que é fundamental acompanhar, debater e incidir sobre as proposições legislativas em tramitação, também é indispensável reafirmar o que já está estabelecido na Constituição Federal de 1988: o Artigo 227 estabelece que o Estado, a sociedade e a família devem assegurar, com absoluta prioridade, que toda criança e adolescente estejam salvos de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Desse modo, observamos que, para que as crianças e adolescentes estejam devidamente protegidas contra o abuso e à exploração sexual, são também necessários investimentos robustos nas políticas públicas, além de articulação entre as distintas pastas que asseguram cultura, educação, saúde, aprendizagem, cuidado, entre outras a esse público.

Izabela Nalio Ramos é Mestra em Antropologia Social (USP) e assessora técnica do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção a Adolescentes no Trabalho (FNPETI)

Katerina Volcov é Doutora em Ciências e Secretária Executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção a Adolescentes no Trabalho (FNPETI)