Para além dos números: Posicionamento do FNPETI sobre a PnadC: Trabalho de Crianças e Adolescentes de 5 a 17 anos de idade 2023 apresentada nesta manhã pelo IBGE
Brasília, 18/10/2024 – O IBGE divulgou nesta sexta-feira (18) a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC): Trabalho de Crianças e Adolescentes de 5 a 17 anos de idade 2023 - Estatísticas Experimentais. Segundo os dados da pesquisa, há cerca de 1.6 milhão de crianças e adolescentes em trabalho infantil e este é o menor número de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil desde o início da série histórica, em 2016.
No entanto, a meta 8.7 da Agenda 2030 da ONU, da qual o Brasil é signatário, ainda está longe de ser atingida, visto que a mesma pesquisa revela que 586 mil crianças e adolescentes continuam vítimas de trabalho infantil em suas piores formas, de acordo com a Lista TIP, instituída pelo Decreto nº 6.481/2008, que regulamentou termos da Convenção 182 da OIT, definindo 93 piores formas de trabalho infantil.
Segundo a secretária executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, Katerina Volcov: “Os resultados da pesquisa refletem os esforços do Brasil para erradicar o trabalho infantil, conforme o compromisso global assumido na Agenda 2030, da qual o Brasil é signatário. Isso significa que há avanços nas iniciativas de assistência às populações mais vulneráveis. No entanto, ainda temos 586 mil crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil nas piores formas, que precisamos erradicar até o próximo ano (2025). Essa não é uma tarefa simples, pois envolve camadas sociais complexas que devemos enfrentar”, destacou.
Volcov reforçou ainda que o FNPETI participa ativamente dos debates e da construção, junto a governos, sociedade e demais atores do sistema de garantia e proteção dos direitos de crianças e adolescentes, a fim de que se encontrem meios para combater essa violência, que, em situações contemporâneas, encontra novas formas de perpetuar-se no Brasil. “Nós observamos que a problemática do trabalho infantil conta com novas modalidades como o trabalho digital infantil, que parece ser bem aceito como possibilidade de modo de vida de uma criança ou de um adolescente pela sociedade. Além disso, os aspectos socioculturais das Regiões brasileiras, muitas vezes, naturalizam o trabalho infantil como é o caso das e dos trabalhadores domésticos infantis e das crianças que exercem atividades laborais nos contextos rural, das águas e das florestas”, explica a secretária executiva do Fórum.
O FNPETI acompanha de perto os esforços do Brasil para erradicar o trabalho infantil no país desde o não cumprimento da meta em 2016 quando assumiu o compromisso na 2ª Conferência Global sobre o tema, realizada em Haia, na Holanda, em 2010.
Ao ser signatário da Convenção nº 182 da OIT, da Convenção nº 138 da OIT e ao aderir à Agenda 2030 da ONU, o Brasil está formalmente comprometido com a erradicação do trabalho infantil, com foco particular em suas piores formas, até 2025. Contudo, segundo estudo realizado pelo FNPETI, em 2017, restariam ainda 546 mil crianças e adolescentes trabalhando em 2025, e esse cenário parece bastante viável em vista da estimativa apresentada pelo IBGE. “Contarmos com 586 mil crianças e adolescentes envolvidas em uma das piores formas de trabalho infantil é inaceitável quando o Estatuto da Criança e do Adolescente preconiza que crianças e adolescentes são prioridade absoluta e as políticas públicas voltadas a este segmento populacional devem ter primazia no orçamento público”, enfatiza Volcov.
A redução numérica, portanto, não reflete uma transformação estrutural profunda para a erradicação total dessa grave violação de direitos. Ainda são necessárias mudanças na legislação, participação mais efetiva e articulada entre Ministérios, investimentos nas políticas públicas e nas ações de fiscalização, além de capacitação para a identificação e atendimento de crianças e adolescentes vítimas. Além disso, é fundamental que esforços sejam enveredados com fins ao combate da subnotificação da ocorrência sistemática do trabalho informal e da cooptação de crianças e adolescentes para atividades laborais ilegais, como o comércio de drogas ilícitas.
Todo esse processo exige esforço e cooperação entre governo, empregadores, trabalhadores, sistema de justiça, organizações da sociedade civil, organismos internacionais e academia, para que o país avance na Agenda 2030 e possa apresentar resultados ainda mais consistentes no cumprimento do ODS 8 e da Meta 8.7, em particular no combate às piores formas de trabalho infantil.
Sobre a Pesquisa:
O IBGE apresenta informações sobre as atividades econômicas e de produção para o próprio consumo, assim como os afazeres domésticos e o cuidado de pessoas, realizados por crianças e adolescentes de 5 a 17 anos de idade. A divulgação, em caráter experimental, tem foco na adoção da Resolução IV da 20ª Conferência Internacional de Estatísticos do Trabalho (International Conference of Labour Statisticians - ICLS), realizada em 2018, sobre estatísticas de trabalho infantil, promovida pela Organização Internacional do Trabalho (International Labour Organization - ILO).
Para essa população, foi mensurado o contingente que se encontrava em situação de trabalho infantil, bem como suas características, tais como idade, sexo, cor ou raça, condição de estudante, além de aspectos relacionados ao trabalho, como as horas trabalhadas, o rendimento do trabalho e o tipo de ocupação exercida. São apresentados também os resultados do trabalho coordenado pelo IBGE, que buscou, por meio da Pnad Contínua, classificar as crianças e adolescentes de 5 a 17 anos que desenvolviam atividades da Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil – Lista TIP. Assim, além da mensuração da população em situação de trabalho infantil, foi possível identificar se as ocupações exercidas por elas constavam na Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil.
Alguns números de destaque:
- O Brasil tinha 1,607 milhão de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos de idade em situação de trabalho infantil em 2023, o menor contingente desde 2016, quando teve início a série histórica da PNAD Contínua para esse indicador. Esse contingente caiu 14,6% frente a 2022 (1,881 milhão) e 23,9% frente a 2016 (2,112 milhões).
- A proporção de crianças no trabalho infantil havia interrompido a sequência de quedas da série histórica e subido para 4,9% em 2022. Em 2023, esse indicador voltou a cair, chegando a 4,2%, menor percentual da série histórica.
- O maior contingente de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos de idade em situação de trabalho infantil estava no Nordeste (506 mil) mas a maior proporção estava na Região Norte, onde 6,9% das crianças e adolescentes de 5 a 17 anos estavam em situação de trabalho infantil.
- Quase dois terços (65,2%) das crianças e adolescentes em trabalho infantil eram pretas ou par-das. Esse percentual superava a participação deste grupo de cor ou raça na população do país de 5 a 17 anos de idade (59,3%).
- O trabalho infantil afasta as crianças da escola. Enquanto 97,5% da população de 5 a 17 anos de idade eram estudantes, entre os trabalhadores infantis esta taxa era de 88,4%.
- Em 2023, o Brasil tinha 586 mil crianças e adolescentes de 5 a 17 anos de idade exercendo as piores formas de trabalho infantil, que envolviam risco de acidentes ou eram prejudiciais à saúde e estão descritas na Lista TIP. Esse contingente foi o menor da série histórica e teve uma redução de 22,5% frente a 2022, quando 756 mil crianças e adolescentes do país estavam nessa situação.
- As desigualdades observadas no mercado de trabalho do país se estendem ao universo do trabalho infantil. O rendimento médio dos trabalhadores infantis do sexo masculino era de R$ 815, enquanto as do sexo feminino recebiam R$ 695. Para pretos ou pardos no trabalho infantil, o rendimento médio era de R$ 707, e de R$ 875 para os brancos na mesma situação.
- O trabalho em atividades econômicas não eximia crianças e adolescentes dos afazeres domésticos. Na verdade, a proporção dos envolvidos em afazeres domésticos era maior entre os que trabalhavam (75,5%) do que entre os que não realizavam nenhuma atividade econômica (51,7%).
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Ana Cláudia Castro – comunicacao@fnpeti.org.br