
As organizações que integram a Marcha Global Contra o Trabalho Infantil na América do Sul fazem um apelo para que a luta contra o trabalho infantil volte a ser uma prioridade na agenda dos governos, das empresas e da sociedade civil.
Longe de cumprir a meta de erradicar as piores formas de trabalho infantil até 2025, o problema aumentou. Na região, 8,2 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos estão em situação de trabalho infantil (UNICEF-OIT, 2020). Deste total, 61,5% são crianças de 5 a 13 anos, abaixo da idade mínima permitida para trabalhar. Além disso, 4%, o equivalente a 5,5 milhões, realizam trabalhos perigosos, com forte concentração nas atividades agrícolas e extrativistas. O comércio e os serviços — especialmente o trabalho doméstico — também engrossam as estatísticas. A infância migrante, em especial de origem venezuelana, enfrenta riscos crescentes de exploração laboral, tráfico de pessoas e exclusão social.
É preocupante o estancamento estrutural e a mudança nas prioridades políticas, assim como a crescente desconexão com os marcos normativos e o desfinanciamento que impede sua aplicação efetiva nos países da região:
● Argentina: A lista de trabalhos perigosos não foi atualizada, dificultando a proteção de adolescentes que trabalham. Estruturas como as COPRETI funcionam com recursos escassos e sem articulação nacional. Há cortes em programas estatais voltados para a infância.
● Peru: A lista de trabalhos perigosos foi atualizada, mas a elaboração da Política Nacional está estagnada. Não houve nova convocação para a certificação SELTI, ferramenta de compromisso empresarial para eliminar o trabalho infantil nas cadeias de suprimentos.
● Brasil: O FNPETI mantém sua institucionalidade ativa. A Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (CONAETI) foi reinstalada e a articulação com a fiscalização trabalhista foi fortalecida. Entretanto, houve redução de recursos para o enfrentamento do problema em nível nacional.
● Chile: A Lei 21.430 de Garantias da Infância começou a ser implementada. No entanto, ainda não incorpora a especificidade do trabalho infantil como prioridade.
● Colômbia: Foi elaborada uma linha de política pública sobre Piores Formas de Trabalho Infantil (PFTI), mas ainda não foi implementada nos territórios.
● Equador: Não houve avanços legislativos recentes. Há um enfraquecimento da institucionalidade intersetorial e nenhum financiamento específico para essa agenda.
Aos fatores estruturais — pobreza, desigualdade, exclusão educacional — somam-se novas ameaças: violência armada, migração forçada, fragmentação institucional, ausência de fiscalização e enfraquecimento das políticas públicas.
Diante desta grave situação, instamos os Estados a:
● Recolocar a erradicação das PFTI como prioridade política, com orçamento, metas e indicadores;
● Atualizar as listas de trabalhos perigosos e políticas relacionadas;
● Fortalecer as estruturas de articulação intersetorial;
● Garantir os direitos das crianças migrantes (educação, saúde, documentação);
● Ampliar a fiscalização trabalhista com foco na infância.
Pedimos à Cooperação Internacional:
● Reconsiderar os cortes de financiamento e manter intervenções preventivas;
● Criar ferramentas alternativas para o financiamento de estratégias comunitárias e territoriais lideradas por organizações sociais;
● Apoiar ferramentas tecnológicas, protocolos locais e formação intersetorial;
● Promover sistemas de devida diligência com enfoque em direitos.
Convocamos as Empresas a:
● Implementar sistemas de devida diligência que garantam o cumprimento das normativas sobre trabalho infantil e sobre os direitos das/dos trabalhadoras/es;
● Apoiar os fornecedores, especialmente pequenos produtores, no cumprimento das normas de devida diligência;
● Assumir co-responsabilidade pela oferta de serviços de saúde, educação e proteção social voltados à infância.
Nosso compromisso, enquanto sociedade civil, permanece firme no desenvolvimento de metodologias de abordagem, incidência política, monitoramento e controle social.
As alianças e a busca por mecanismos alternativos de financiamento fazem parte da nossa gestão atual.