
Outubro, marcado como o Mês da Criança, chega neste ano com a sanção do ECA Digital (Lei nº 15.211/2025), considerado um avanço na defesa de direitos de crianças e adolescentes no ambiente virtual. A lei estabelece deveres às plataformas digitais, como verificação de idade, privacidade por padrão, supervisão parental, restrições à publicidade dirigida a pessoas com menos de 18 anos e mecanismos ágeis para retirada de conteúdos nocivos.
Apesar do marco regulatório histórico, especialistas e entidades de defesa de direitos apontam lacunas preocupantes: o ECA Digital não trata de forma direta o fenômeno do trabalho infantil digital.
Nos últimos anos, cresceu o número de crianças e adolescentes expostas à exploração econômica por meio das redes, seja como influenciadores mirins, empreendedores digitais precoces ou produtores de conteúdos monetizados. Também ganham espaço os chamados atletas digitais e participantes de competições de e-sports, muitas vezes submetidos a longas jornadas de treinos e transmissões, além de contratos e patrocínios que trazem pressões típicas do mundo adulto.
Embora muitas dessas práticas sejam apresentadas como “oportunidades” ou “hobbies lucrativos”, configuram trabalho precoce, sujeito a exploração, violação da privacidade e impactos na saúde mental, social e escolar.
Além disso, episódios de exploração sexual online de crianças e adolescentes — incluindo a produção, o compartilhamento e a monetização de vídeos e imagens em plataformas digitais — não foram tratados como piores formas de trabalho infantil, mesmo sendo uma das expressões mais graves de violação de direitos.
Essa ausência de reconhecimento explícito no ECA Digital levanta o alerta de organizações como o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção de Adolescentes no Trabalho (FNPETI), que defende a necessidade de ampliar e aprofundar o debate sobre o trabalho infantil em ambiente digital.
Para a Secretária-Executiva do FNPETI, a regulamentação precisa avançar além da proteção contra conteúdos nocivos, “o ECA Digital é um marco, mas não podemos ignorar que o ambiente virtual também é palco de trabalho precoce e de exploração em suas piores formas. Influencers mirins, empreendedores digitais, atletas de e-sports e até mesmo casos de exploração sexual online são expressões do trabalho infantil em ambiente digital que permanecem invisibilizadas pela nova lei. Precisamos nomear esses fenômenos, orientar as famílias e a sociedade e responsabilizar as plataformas,para que as infâncias não sejam transformadas em mercadoria, nem no espaço físico, nem no virtual”, reforça Volcov.
O desafio que permanece
Enquanto a lei estabelece prazos para plataformas se adequarem às novas regras até março de 2026, a sociedade civil insiste na importância de políticas públicas específicas sobre trabalho infantil digital, que articulem educação, regulação, responsabilização das big techs e apoio a famílias.
No Mês da Criança, o FNPETI ressalta que a garantia de uma infância plena, protegida e livre de exploração deve incluir tanto o mundo offline quanto o digital — onde riscos e oportunidades caminham lado a lado.